Letícia era uma jovem de 27 anos, formada e com um emprego estável em uma grande empresa de tecnologia. Seus dias eram preenchidos por tarefas que dominava e uma rotina que parecia ideal aos olhos dos outros. Cercada de amigos, tinha uma vida social ativa, mas ainda assim, sentia-se estranhamente insatisfeita. Era como se algo faltasse, uma sensação persistente de que havia mais a ser vivido.
Todas as noites, ao rolar o feed das redes sociais, Letícia sentia uma mistura de fascínio e desconforto. Suas telas eram uma vitrine de conquistas e alegrias de pessoas próximas e até de desconhecidos. Era um desfile interminável de viagens exóticas, celebrações, promoções de carreira e momentos perfeitos. A cada atualização, sentia um aperto no peito. Cada postagem parecia um lembrete silencioso das experiências e realizações que ela ainda não havia conquistado.
No início, Letícia tentou ignorar essa sensação, mas a inquietação era constante e persistente. No trabalho, ela até tentava se concentrar, mas sua mente vagava, questionando por que ela não conseguia alcançar o mesmo nível de felicidade que via na vida dos outros. Em pouco tempo, essa comparação começou a impactar suas escolhas. Decidida a "melhorar sua vida", Letícia criou um plano. Ela precisava de um novo estilo de vida – um que parecesse impressionante, cheio de momentos dignos de serem postados.
Para começar, começou a frequentar lugares populares na cidade, aqueles dos quais todos falavam. Postava fotos nos pontos mais badalados, mesmo que não sentisse conexão com o ambiente. Passou a marcar presença em eventos de networking que não lhe despertavam interesse, apenas para ser vista e fazer novas conexões. Com o tempo, seu perfil foi ganhando mais curtidas, e os comentários de admiração surgiam. Era uma euforia constante, e Letícia finalmente sentia que estava "pertencendo".
Contudo, conforme o tempo passava, a empolgação inicial dava lugar a um vazio que a cada dia ficava mais forte. Quanto mais se envolvia nas redes, mais se perdia de si mesma. Olhava as fotos que postava e notava a expressão superficial de um "eu" que, na realidade, estava cada vez mais distante. A vida que mostrava ao mundo parecia atraente, mas não tinha significado para ela. As experiências que tentava moldar conforme o que esperavam dela se transformavam em uma prisão.
Em uma noite fria, após um evento badalado em que, mais uma vez, sentiu-se deslocada, Letícia chegou em casa e se jogou no sofá. A cabeça pesava, e seu corpo parecia exausto de todo o esforço para parecer alguém que não era. Procurando algo para aliviar o peso da mente, ela começou a revirar gavetas antigas e encontrou um caderno de capa azul, encardido e com páginas amareladas. Era um diário dos tempos da faculdade, onde escrevia sobre seus sonhos e planos para o futuro. Ali, entre desenhos e rabiscos, estavam anotações sobre seu amor pela arte, o desejo de fazer uma viagem solo pela América Latina e a paixão por fotografia que nutria desde a adolescência.
Sentiu um nó na garganta ao folhear cada página e se deu conta de como aqueles desejos haviam se perdido no meio do caminho. No fundo, aquele caderno era um lembrete do que realmente a fazia feliz, da sua essência. O quanto de si mesma ela havia silenciado para corresponder a um padrão que, na verdade, não lhe pertencia?
Nos dias que se seguiram, Letícia decidiu resgatar a própria identidade. Começou a redesenhar sua vida, deixando de seguir perfis que apenas despertavam comparação, priorizando atividades e lugares que realmente lhe faziam bem. Em vez de eventos de networking, voltou a frequentar exposições de arte e a se dedicar aos próprios desenhos. Relembrou a paixão pela fotografia, começando a registrar pequenos momentos do cotidiano, não para compartilhar, mas para guardar para si.
Aos poucos, os dias foram ganhando uma nova leveza. Letícia passou a dedicar menos tempo nas redes sociais, substituindo a pressão do reconhecimento por momentos de verdadeira conexão com quem era. Não foi fácil se desvencilhar das comparações, mas, com o tempo, a sensação de vazio foi dando lugar a algo novo: paz e uma alegria que, finalmente, parecia autêntica.
Letícia descobriu que, ao abrir mão das ilusões externas e buscar o que realmente tinha valor para ela, encontrou uma felicidade que jamais conseguiria em curtidas ou aprovações digitais.